O Império dos Ambissinistros – Wilson Carvalho, 15.08.2020
Confesso que me aproprio de um termo que ouvi do pesquisador Jadson Porto para a esta (curta) análise sobre direita e esquerda que apresento a seguir.
Em primeiro lugar, a minha motivação para esta abordagem devo a um sociólogo de facebook que conseguiu me irritar com uma análise sobre direita e esquerda na qual reduz a questão a um embate entre os bons e os maus. Apesar das suas credenciais de extra-super-pós-doutor, sua abordagem, bem espremida, resulta simplória e em nada ajuda, muito pelo contrário, atrapalha porque apenas inverte o que eu ouvi durante a ditadura civil-militar, e que enfastiou minha juventude. Por isso pretendo fazer uma abordagem simples, sem ser reducionista, começando do básico: a nossa mão direita.
É fato que a grande maioria das pessoas, mormente na Europa, é destra, enquanto que os canhotos são minoria. Daí que não é de estranhar que a linguagem fixe para o signo destro/destra (maioria) o significado de caminho conhecido e sempre trilhado, e por via de consequência, aquilo que é certo (dextra no Latim é a mão direita, mas também habilidade). Em contrapartida, para a mão esquerda e para os canhotos (a minoria), o signo fixa “caminho diferente, desconhecido”. Daí que sinister (latim), significa tanto esquerda como infeliz, funesto, de mau agouro. Em português se pode dizer para alguém dobrar à direita para chegar à faculdade de Direito. Há também o dito popular: “Pela direita vão os direitos”.
Por coincidência ou não, esses termos ficaram mais conhecidos politicamente com a Revolução Francesa (uma revolução burguesa, diga-se de passagem). Na Assembleia os Girondinos, grupo político composto de burgueses/ricos que defendiam mudanças parciais na estrutura do poder (monarquia constitucionalista), sentavam à direita, enquanto que os Jacobinos sentavam à esquerda e defendiam mudanças na estrutura da sociedade visando transferir o poder para o povo (a República). No fim, Napoleão coroou-se imperador e frustrou a todos.
Na Filosofia esse sentido político se consolida com a obra de Hegel, que se torna uma espécie de pensamento oficial nas grandes universidades, e seu legado historicista deixa margem para duas linhas de interpretação: a direita hegeliana que entende que a sociedade desigual precisa ser reformada; e a esquerda hegeliana, que entende que a necessidade de justiça social exige uma mudança radical na estrutura da sociedade. Em resumo, a direita pretendia mudanças para minorar a desigualdade pela educação e pela ciência aplicada, enquanto que a esquerda entendia que era necessário quebrar a espinha dorsal da sociedade desigual atacando a base da desigualdade: a propriedade privada dos meios de produção.
Claro que não podemos ignorar o papel da religião na cristalização desses significados e de simbologias correlatas, desde o vermelho bolchevique na Revolução Russa até o vermelho “imoral” do protestantismo. A cor vermelha, no ocidente cristão sempre remeteu à “satã”, à dor e à morte. Mas em russo, o vermelho significa tanto a cor como “belo”. Interessante lembrar que o vermelho significa “perigo” na Revolução Francesa. E que os orientais, em sua maioria, não associam o vermelho ao mal e à dor.
Enfim, o ponto crucial da questão não é a bondade ou a maldade. São os interesses de classe. Se você é um burguês bem estabilizado na vida, então não tem nenhum interesse em mudanças radicais. Se você é um trabalhador que consegue descobrir que está sendo explorado, é claro que você almeja por mudanças.
Disso tudo resulta que, entre os ricos, os interesses de classe se inclinam para a economia de mercado (a democracia burguesa – liberdade individual e propriedade acima de tudo), e entre os pobres que sabem que são explorados, para a economia planificada (a democracia popular – Estado forte e impositivo da justiça social acima da liberdade individual). Evidentemente, para os que nem se apercebem da exploração, a vida segue do mesmo jeito.
E os partidos políticos e seus líderes ambissinistros, onde entram nessa questão?
É que os partidos políticos ambissinistros são aqueles constituídos em função de interesses de seus “proprietários”, que geralmente se apresentam como ídolos. Aferrados ao poder, são capazes de qualquer coisa pela dominação das massas, e quando chegam ao poder não o entregam mais. De direita ou de esquerda, eles não têm nenhuma ideologia, assumem aquela que está na moda, aquela que está empolgando os jovens, agradando as multidões. São os camaleões da política, dizem somente o que as pessoas querem ouvir.
Talvez seja por isso que as democracias burguesas, quando tomadas por um líder messiânico, tornam-se demagogias (o poder de ninguém, ou dos mais espertos) e/ou oligarquias mantidas por eleições manipuladas por algumas poucas famílias que dominam uma região como se fossem feudos. Da mesma forma as democracias populares, quando tomadas por um líder carismático aferrado ao poder, tornam-se ditaduras e/ou oligarquias mantidas por eleições fraudadas (o poder dos mais fortes, dos mais ferozes ou dos mais espertos). Políticos sinistros, de direita ou de esquerda, mais que ladrões que roubam com as duas mãos, são prestidigitadores que aplicam sua arte para manterem-se eternamente no poder.
A solução? Fazer a coisa certa. O cidadão tem que entender que síndico, vereador, deputado, senador, presidente, o que for, só merece o seu voto se tiver um passado de probidade, se for honesto e competente e se defender o fim das imunidades e privilégios que garantem a impunidade dos poderosos.